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Compartilhar mensagem de whatsapp sem Consentimento pode gerar indenização

 Os novos meios de comunicação, cada vez mais modernos e instantâneos, expõem os seres humanos a constantes interferências alheias, que podem refletir em prejuízos financeiros e abalos a imagem do indivíduo exposto, podendo gerar injustas demissões no ambiente de trabalho ou destruir carreiras promissoras. 

Esse compartilhamento de mensagens sem autorização do emissor coloca em evidência os conflitos existentes entre o direito à liberdade de informação, de um lado, e o direito à privacidade, do outro. 

A referida colisão de direitos, segundo o STJ, é verificada nas situações em que o conteúdo das conversas trocadas via WhatsApp possa interessar a terceiros. Em atenção à teoria das esferas, a Corte afirmou que as conversas enviadas se situam na esfera confidencial. Assim, tendo em mente que os direitos fundamentais assumem a natureza de princípios, faz-se necessária a realização de um juízo de ponderação. 

Ao que parece, os dois institutos são antagônicos, como água e fogo. A discórdia pode ser percebida claramente em casos de compartilhamento de conversas privadas havidas em aplicativos de mensagens, na medida em que não é possível controlar a disseminação da mensagem, que pode ser replicada várias vezes, tornando-se uma notícia conhecida a nível nacional ou global. 

Imagine a seguinte situação: um torcedor vaza para as mídias sociais e para a imprensa em geral prints (capturas de tela) das mensagens trocadas em um grupo do aplicativo WhatsApp, do qual era membro? Tal grupo era intitulado “Indomáááááável F.C.” e possuía por volta de 10 participantes, entre Dirigentes (um dos quais Vice-Presidente do clube) e torcedores fanáticos. 

O conteúdo abrangia diversas considerações, dentre as quais, mensagens de desagrado para com a atual administração do time e fotografias pessoais dos participantes. Esta divulgação acabou em desligamento de diversos membros do referido clube esportivo. Loucura? Mas aconteceu! 

A propagação das informações acabou por prejudicar integrantes do Coritiba Foot Ball Clube, um dos maiores times do Paraná, que acreditaram que, diante da natureza restrita e amistosa da turma e, bem assim, pela intimidade entre os membros do grupo, o conteúdo particular veiculado naquele ambiente jamais seria disseminado, mesmo que este entendimento não tenha sido verbalizado pelos integrantes. 

A comunicação ocorria como de costume, com tom extrovertido, conjuntura extremamente comum nestes aplicativos, em que o coloquial predomina ao formal, quando o tema do descontentamento com a gestão do clube passou a ser, em certo instante, o objeto da conversa. As capturas de tela foram compartilhadas por um membro logo após sair deste grupo. Agora o estrago estava feito. 

O cenário de difusão de informações restritas e íntimas, desde que os aplicativos de mensagens instantâneas se generalizaram e familiarizaram, tornou-se extremamente habitual. Para se ter uma ideia, cerca de dois bilhões de pessoas utilizam o WhatsApp diariamente. 

Mas, calma! Já existem determinações judiciais que visam coibir a difusão desenfreada de conteúdos reservados neste País Tropical, dando um cartão vermelho para quem toma tal atitude. Na primeira instância, por exemplo, o autor da divulgação foi condenado ao pagamento de 40 mil reais, à título de danos morais, aos integrantes do clube de futebol afetados pela conduta do torcedor. 

A sentença de primeiro grau foi objeto de recurso, julgado pelo Tribunal de Justiça do Paraná (“TJPR”), que manteve a decisão. A “partida”, ainda, teve prorrogação, chegando ao Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) através do Recurso Especial n.º 1903273/PR. 

Na Corte Superior, o torcedor se defendeu argumentando que a gravação e propagação das conversas não constituiu ato ilícito, tendo em vista que, segundo ele, o conteúdo das mensagens seriam de interesse público e as mensagens foram divulgadas na íntegra, dando a entender que os diálogos capturados não seriam restritos àqueles que participavam do grupo. 

Ocorre que a Terceira Turma do STJ não acolheu os argumentos do torcedor, destacando que a disseminação pública dos diálogos contidos no aplicativo de mensagens, sem anuência da totalidade dos participantes, constitui ato ilícito, ensejando a responsabilização civil pelos danos ocasionados. 

Com relação à divulgação do seu conteúdo, para a adequada tutela da privacidade e em atenção à boa-fé objetiva, é necessário analisar a expectativa de privacidade do indivíduo (SCHREIBER, Anderson. Direitos da Personalidade. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2013, pp. 145-146). 

Partindo dessas premissas, foi destacado pelo STJ, que “ao enviar mensagem a determinado ou determinados destinatários via WhatsApp, o emissor tem a expectativa de que ela não será lida por terceiros, quanto menos divulgada ao público, seja por meio de rede social ou da mídia. Essa expectativa advém não só do fato de ter o indivíduo escolhido a quem enviar a mensagem, como também da própria encriptação a que estão sujeitas as conversas” 

Foi citado o entendimento da doutrina de que a quebra da confidencialidade da comunicação significa frustrar o direito do emissor de escolher o destinatário do conteúdo da sua comunicação. (MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 293) 

O julgado excepcionou a regra acima somente nas hipóteses em que a exposição ocorrer com o fim de resguardar direito próprio do receptor ou no caso de evidente interesse público, o que não era o caso dos autos. 

O colegiado fez uma analogia entre as conversações por WhatsApp – ou qualquer outro aplicativo de mensagens instantâneas – e as interlocuções por telefone, revelando que ambos os diálogos são protegidos pelo sigilo das comunicações, de sorte que o compartilhamento do material para terceiros – o que inclui mídias digitais e redes sociais – sujeita-se ao consentimento dos participantes ou à autorização judicial. 

A Relatora Ministra Nancy Andrighi, em seu voto condutor, manifestou que: “Ao levar a conhecimento público conversa privada, além da quebra da confidencialidade, estará configurada a violação à legítima expectativa, bem como à privacidade e à intimidade do emissor, sendo possível a responsabilização daquele que procedeu à divulgação se configurado o dano”

Isso quer dizer, traduzindo para o português bom e claro, que o sigilo das comunicações está intimamente associado à liberdade de expressão e estimula a salvaguarda aos direitos à intimidade e à privacidade que, além de constitucionais, também estão presentes no Código Civil (artigos 20 e 21). E por tal motivo merecem a tutela do Poder Judiciário para coibir os abusos que porventura sucedam, como identificado no caso descrito. 

Foi decidido, na mesma ocasião, que o simples registro de um bate-papo por um dos componentes, seja por meio de gravação ou através de captura de tela, não enseja, por si só, ato ilícito, mesmo que os outros participantes da conversa não saibam. O contratempo está na disseminação desses arquivos. 

O STJ levou em consideração em sua fundamentação a chamada criptografia de ponta a ponta, sistema intrínseco ao aplicativo desde 2016. A ferramenta em questão, em suma, obsta a receptação do diálogo por terceiros e até mesmo pelos próprios gerenciadores da conta, mantendo restritos à órbita dos próprios usuários. 

À vista disso, é reforçado o fundamento de que as comunicações realizadas por WhatsApp são providas de privacidade, que não pode ser abolida tão facilmente, sem autorização dos interlocutores que conversam entre si ou em caso de determinação judicial, uma vez que os diálogos travados não são, a princípio, de interesse público. 

Se a intenção do interlocutor fosse levar ao conhecimento de diversas pessoas o conteúdo da mensagem, teria optado por uma rede social menos restrita ou mesmo repassado a informação à mídia para fosse divulgada. O entendimento foi seguido, de forma unânime, pelo demais Ministros que participaram do julgamento. 

Não pode ser tolerado que conversas privadas em grupos possam ser levadas ao conhecimento público com o único propósito de ridicularizar ou arruinar a honra dos sujeitos envolvidos, ainda que esteja expondo opiniões negativas ou sentimentos pessoais de terceiros, pois isto representa uma violação à legítima expectativa, à privacidade e à intimidade do emissor. 

É fato que, a cada dia, o direito à privacidade adquire um novo contorno, tendo em vista a expansão dos meios de comunicação, que vem gerando uma crise no jornalismos global, na medida em que a mídia televisiva ou escrita não consegue concorrer com a divulgação de informações e notícias através dos aplicativos de mensagens instantâneas, como o Facebook MessengerTelegram, Signal, Whatsapp e tantos outros. Muitos apresentadores de telejornais estão sendo substituídos, demitidos ou tendo o salário reduzido. 

As mídias como um todo, em especial com o avanço da internet, deram origem a uma inovação tecnológica que se trata de uma verdadeira revolução. Contudo, o direito à privacidade deve ser protegido e prestigiado como uma valorosa conquista, que não deve limitar, mas preponderar e evoluir. 

Consequentemente, ao prestigiar tais pontos, o recente julgado do STJ vai ao encontro do fortalecimento da defesa da privacidade e dignidade das pessoas, além de provocar maior vigilância e redobrar os cuidados por parte dos usuários, 

posto que a propagação de conversas sem concordância dos demais interlocutores poderá ensejar responsabilização cível. 

Assim, aquele que causar danos ao participante de conversa particular em razão da exposição pública de seu conteúdo, é obrigado a indenizar. No caso apresentado, como resultado, a decisão impôs ressarcimento de 5 mil reais a cada um dos prejudicados com o vazamento das informações. A regra é clara, Arnaldo: este gol estava impedido. 

Para mais informações sobre a responsabilização de sujeitos que compartilharam conversas ou capturas de tela de aplicativos de mensagens instantâneas e prejudicaram o emissor em âmbito pessoal ou profissional, acesse o Blog do Colunista Iuri Cavalcante Reis no site www.cavalcantereis.adv.br e deixe suas dúvidas nos comentários ou através do e-mail iuri@cavalcantereis.adv.br. Artigo escrito em coautoria com a advogada Thaynná de Oliveira Passos Correia, da equipe do Cavalcante Reis Advogados (Instagram @cavalcantereisadvs). 

Autor: Dr. Iuri Cavalcante, CEO do Escritório Cavalcante Reis

Coautora: Dra. Thaynná Passos, Advogada Associada do Escritório Cavalcante Reis

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