“Modernizar o universo negocial do País”. Essa é a promessa da nova Lei n.º 14.195/2021, que completa um mês de existência hoje, no dia 26 de setembro de 2021, e tem origem na Medida Provisória do Ambiente de Negócios, integrando a estratégia do governo para recuperação econômica no cenário pós pandemia.
Segundo a Casa Civil, o objetivo da nova legislação, além de modernizar o mercado nacional, é melhorar a posição do Brasil no relatório Doing Business do Banco Mundial e atrair investimentos estrangeiros. O referido relatório avalia o nível de facilidade de se fazer negócios em 190 economias do mundo, por meio de dez indicadores diferentes, devendo elevar o nosso índice em até 20 posições.
Dentre as inovações, estão a desburocratização do processo de abertura de empresas, a maior proteção aos acionistas minoritários, a eliminação de análises prévias feitas apenas no Brasil dos endereços das empresas, a automatização da checagem de nome empresarial em segundos, além de tratar do funcionamento e do Comitê Gestor da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios (Redesim) e da cobrança dos conselhos profissionais.
A simplificação também alcança o comércio exterior de bens e serviço, através da disponibilização de guichê único eletrônico aos operadores do comércio exterior e da padronização e simplificação do pagamento de taxas relacionadas às operações dessa atividade.
A recente regulamentação se utiliza de um modelo intitulado “transversal”, isto é, propicia a transformação em diversos setores do ordenamento jurídico, incluindo, nesse espectro, a Lei das Sociedades Anônimas, o Código Civil, bem como o Código de Processo Civil e a Lei do Representante Comercial. A ampla regulamentação engloba desde a prescrição intercorrente no Processo Civil até a regulação da profissão de tradutor e intérprete público.
Ao destrinchar as novidades mais relevantes, destaca-se a maior facilidade para a abertura e o funcionamento de pessoas jurídicas e o desenvolvimento de atividades lucrativas. Neste ponto, a Rede Nacional para Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios (“Redesim”) passará a ser dirigida por um Comitê, o qual terá habilitação para emitir resoluções acerca da classificação de atividades de risco.
O efeito concreto disso é uma maior facilidade na obtenção de licenças, alvarás e outros atos públicos de liberação/autorizativos. A norma busca, em suma, satisfazer indicadores internacionais, especialmente aqueles contidos no relatório “Doing Business”, do Banco Mundial, bem como tornar mais ágil o ambiente de negócios de uma forma geral.
Importante mencionar, para mais, a expressiva alteração das sociedades anônimas (“S.A.”). A Lei n.º 14.195/2021 assentiu pela formação de uma ou mais classes de ações ordinárias com a competência de voto plural (não superior a dez votos por ação ordinária).
Muito embora essa possibilidade concedida às ações ordinárias se sujeite à deliberação da sociedade com quórum de votação específico e seja delimitado ao lapso temporal de sete anos – mesmo que prorrogável por qualquer prazo –, nota-se que o citado “voto plural” acaba por corromper o preceito de que cada ação ordinária representaria um único voto.
Ocorre que tal forma de votar se trata de uma técnica já absorvida em diversos países, como Estados Unidos, Reino Unido, Hong Kong e Singapura, e que poderá ser utilizado como um valoroso incentivo para as empresas – principalmente as startups – abrirem capital na bolsa de valores brasileira, como a B3, por exemplo, ao invés de o fazerem externamente. Em exemplificação, há pouco, marcas como XP, Stone e PagSeguro, emitiram ações nos Estados Unidos com a adoção do procedimento denominado “superON”, que autoriza a utilização de papéis ordinários com direito de voto individual e ações com voto plural.
Em síntese, o instrumento, já disseminado pelo mundo e empregado por empresas gigantes, tais quais Google, LinkedIn e Facebook, admite que os fundadores de uma corporação adquiram capital através da entrada de novos investidores, sem, obrigatoriamente, renunciar ao poder de controle. Não se pode negar que é, de fato, vantajoso.
A instauração de um intitulado Sistema Integrado de Recuperação de Ativos (“Sira”) pode ser tida, também, como temática despontada pela norma. Isto significa que se busca, em resumo, oportunizar, da maneira mais célere possível, a identificação, localização e constrição de bens, além de permitir o encontro de devedores em todo a esfera tupiniquim.
Melhor dizendo, o Sistema de Recuperação de Ativos – Sira se empenha em conter as despesas para a oferta de créditos utilizando, para tanto, de procedimentos que oportunizam maior eficiência às sentenças voltadas à restituição de valores devidos.
Não para por aí! Os conselhos profissionais, a partir de agora, não poderão suspender ou impedir o exercício da profissão, mesmo que em razão de inadimplemento ou atraso na quitação das anuidades. O tema é alvo de controvérsias entre especialistas que anteveem um aumento exponencial na quantidade de devedores a essas agremiações. Esperemos e veremos… A EIRELI – ou Empresa Individual de Sociedade Limitada – não passou ilesa às mudanças trazidas pela Lei n.º 14.195/2021, isso porque este regimento foi extinto.
Confesso que o aniquilamento da Eireli não causou tanto espanto, tendo em vista que a figura, há algum tempo, já se encontrava no rol das esquecidas, tendo em vista o advento das Sociedades Limitadas Unipessoais, inauguradas pela Lei da Liberdade Econômica.
As poucas Eirelis que restaram serão, automaticamente, transmutadas em Sociedades Limitadas Unipessoais, a despeito de qualquer ação dos titulares dessas empresas. A título de esclarecimento, o Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração (“DREI”) será o órgão responsável por se debruçar sobre a matéria.
Até mesmo assuntos de cunho exclusivamente processuais foram inseridos na Lei do Ambiente de Negócios, como é o caso da prescrição intercorrente, presente, agora, no Código de Processo Civil. A partir de então, a prescrição intercorrente observará o mesmo prazo de prescrição da pretensão, observadas as causas de impedimento, de suspensão e de interrupção previstas no Código de Processo Civil (artigo 206-A).
Entrou em vigor, bem assim, a configuração do “estabelecimento virtual”. Isto é, para fins de registro, atualmente, é perfeitamente cabível a indicação de endereço físico do empresário individual ou de um dos sócios da sociedade empresária com assentamento virtual. Novidade interessante, levando em consideração a era tecnológica em que estamos inseridos há algum tempo.
Cuidado!!! Agora que chamei sua atenção, fique ligado na viabilidade, com a instituição da lei, da citação de pessoas jurídicas por e-mail. Resumidamente, as PJs necessitarão comunicar e, ainda, atualizar (sempre que houver alteração), os dados cadastrais da corporação perante o judiciário. Consequentemente, torna-se total e completamente realizável a citação e intimação on-line.
Quanto aos prazos, serão contados a partir do quinto dia útil, não esquecendo da confirmação de recebimento do e-mail. Mas, espera aí! Se pensa que basta não comunicar a recepção da informação pelo endereço virtual para burlar o judiciário, está muito enganado. Deixar de noticiar o recebimento da citação ou intimação pelo correio eletrônico consistirá em ato atentatório à justiça, tendo o Juízo poder de aplicar multa de até 5% do valor da causa.
Os institutos da falência e da recuperação judicial também integram as alterações da Lei n.º 14.195/2021. À vista disso, o crédito do representante comercial, hoje, é alinhado e igualado aos créditos trabalhistas. Não só. Ficou estabelecido, ainda, que os “Os créditos devidos ao representante comercial reconhecidos em título executivo judicial transitado em julgado após o deferimento do processamento da recuperação judicial, e a sua respectiva execução, inclusive quanto aos honorários advocatícios, não se sujeitarão à recuperação judicial, aos seus efeitos e à competência do juízo da recuperação”
Percebe-se, portanto, que apesar das adversidades que envolvem a Lei do Ambiente de Negócios, fator normal em todo e qualquer novo instituto, a recente legislação tem o potencial de melhorar o desempenho das empresas ao facilitar atos do dia a dia empresarial, diminuir custos e desburocratizar diversos setores, aumentando a competitividade das empresas e indústrias no mercado nacional e internacional.
Em outras palavras, a legislação é capaz de simplificar – e muito – o panorama corporativo do Brasil, golpeando os contratempos provenientes da burocracia. Contra fatos não há argumentos: diminuindo os sufocos insignificantes, há mais tempo e ânimo para as companhias lapidarem ações que agreguem valor às empresas e fomentem a busca por novas tecnologias.
Não é demais apontar, inclusive, que a recém-nascida diretriz já brota extremamente ordenada ao que dispõe o também recente Marco Legal das Startups (tema já abordado em artigos anteriores e disponível em nosso Blog), que busca impulsionar o ambiente negocial e alavancar o empreendedorismo inovador, dado que a Lei n.º 14.195/2021 promove ganhos pela desburocratização.
O que se espera é que, com menos procedimentos, trâmites, processos e mecanismos, o acesso de novos sócios e investimentos estimule o excelente momento que as empresas mais modernas encontram, hoje, na Terra dos Papagaios e lançar o Brasil a um patamar provavelmente inédito.
No mês passado (08/2021), por exemplo, Startups nacionais receberam aportes de cerca de 772 milhões de dólares, o triplo se compararmos o mesmo mês de 2020. A ideia é que a famosa frase “Burocracia: uma dificuldade para cada solução” seja, definitivamente, banida do dia a dia negocial.
Para mais informações sobre como se adequar ao novo e moderno ambiente de negócios e demais assuntos correlatos ao direito empresarial, acesse o Blog do Colunista Iuri Cavalcante Reis no site www.cavalcantereis.adv.br e deixe suas dúvidas nos comentários ou através do e-mail iuri@cavalcantereis.adv.br. Artigo escrito em coautoria com a advogada Thaynná de Oliveira Passos Correia, da equipe do Cavalcante Reis Advogados. (Instagram @cavalcantereisadvs)
Link do artigo no Jornal A gazeta do Amapá: https://agazetadoamapa.com.br/coluna/1487/o-novo-e-moderno-ambiente-de-negocios-o-primeiro-mes-da-lei-n-o-14-195-2021