CARÊNCIA DE PLANOS DE SAÚDE
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Colocando as cartas na mesa ou no chão, elas mostram o que vai no coração. A frase poética acima representa bem o Memorandum of Understanding, que no bom português significa Memorando de Entendimentos ou, simplesmente, “MOU”.
É um novo instituto de abrangência global que ainda é pouco conhecido pelos brasileiros e, cada vez mais, integra o dia a dia dos empresários. Diante da escassez de artigos sobre o tema, é o momento ideal de destrinchá-lo, a fim de disseminar o seu uso pela comunidade jurídica e empresarial.
Até o momento, o referido instrumento é mais empregado no Direito Internacional Privado para atos com menos formalidade, destinados a registrar princípios gerais e diretrizes, que orientarão futuras relações entre as partes, seja no plano político, econômico, jurídico, cultural ou em outros.
Via de regra, o MOU é utilizado para determinar os direitos e deveres de cada sócio no empreendimento e projetar os próximos passos da empreitada. Na doutrina estrangeira, alguns autores chegam até a enunciar que o instituto é a versão formal de um acordo de cavalheiros, de uma resolução verbal convencionada entre as partes.
Diferentemente de outros contratos societários, no Memorando de Entendimentos não há qualquer exigência de cláusulas específicas a serem inseridas, o que garante aos futuros sócios ampla liberdade para a negociação acerca dos direitos e responsabilidades a serem ajustadas.
Ocorre que o MOU, fundamentalmente, não é capaz de gerar obrigações. Entretanto, pode ser considerado como o passo elementar para o contrato vinculativo e formal, com formatação judicial. A fim de torná-lo mais seguro, é recomendado que se insira cláusulas jurídicas vinculativas, dado que nele as partes detalham suas considerações e se comprometem a segui-las, sendo essa a primeira etapa para nortear as ações de uma operação.
Trata-se, portanto, de uma espécie de “contrato preliminar”, realizado antes da operação acontecer efetivamente, a fim de formalizar os entendimentos, termos, detalhes e o acordo verbal entre os sócios, evitando que mudanças de pontos de vista gerem prejuízos aos envolvidos e objetivando alinhar tudo que foi discutido e combinado entre as partes. Além disso, contém também os principais termos e condições, bem como a participação, o papel de cada um, os valores envolvidos, os diretos e deveres, entre outros. É o alinhamento escrito de tudo que já foi afinado verbalmente.
Assim, ao elaborar um Memorando de Entendimentos que contemple todos esses pontos, os acordantes – e até mesmo os futuros investidores – terão mais proteção e se sentirão mais confortáveis para elevar os aportes e investimentos, diante da formalização por escrito de todos os detalhes, objetivos e expectativas que circundam o negócio, o que se aplica mesma na hipótese de a empresa ainda não ter sido constituída.
Com efeito, é possível confeccioná-lo antes do próprio contrato social, mostrando-se um passo à frente, o que evita a invalidação do negócio jurídico mais adiante, por erro, dolo, lesão, estado de necessidade, entre outros vícios.
É dizer que, no direito brasileiro, ainda não existe legislação específica sobre a matéria, todavia, percebe-se a intenção de que o instituto seja entendido como um contrato preliminar, ou seja: não é e não deverá ser o contrato principal do empreendimento, que deve, assim que viável, ser formalizado de acordo com o negócio a ser implementado.
Eu explico! O contrato preliminar gera uma obrigação de concluir outro contrato, o principal, possuindo em seu objeto uma obrigação de fazer, que é a de concretizar o pacto definitivo.
Veja-se, portanto, que os contratos preliminares nada mais são do que “configurações passagem”, ou seja, intermediários entre as negociações e o contrato perfeito e acabado. Nesta senda, é claro que a atribuição do contrato preliminar é propiciar um contrato futuro, cuja celebração, desde logo, é por alguma razão inconveniente ou mesmo impossível. Essa motivação não interessa do ponto de vista jurídico.
É importante notar que o Memorando de Entendimentos puro e simples não estabelece terminantemente o encargo de celebrar um futuro contrato definitivo, tal qual o contrato preliminar. Embora seja variável o seu conteúdo, o MOU limita-se, geralmente, a instituir normas para o ajuste de um posterior contrato, que poderá ser ou não celebrado, conforme o êxito da negociação, fixando deveres acessórios ligados a esse momento pré-contratual, como os deveres de exclusividade, preferência, sigilo, de arcar com as despesas da negociação, dentre outros.
Entretanto, dependendo dos termos e condições estabelecidos no Memorando de Entendimentos, a obrigatoriedade de celebração do contrato definitivo é perfeitamente cabível. Aqui, estaremos, em verdade, diante de um contrato preliminar, vinculante para as partes acordantes, submetendo-as à celebração do contrato efetivo, sempre que já estejam estabelecidas as condições essenciais do futuro contrato, tais como o objeto, valor, a forma de pagamento, prazos, seguros, garantias e causas para rescisão, salvo se houver, no referido certificado, cláusula de arrependimento ou uma condição essencial do futuro contrato a ser celebrado entre as partes.
No caso acima, qualquer dos celebrantes poderá exigir do outro o exercício do negócio acordado caso uma das partes se recuse a fazê-lo espontaneamente, o que é capaz de gerar para a parte que descumprir o acertado, compromisso de origem contratual, isto é, responsabilidade civil contratual. Nesse sentido, haverá uma infração a um dever estabelecido pela vontade dos contratantes.
Porém, como vimos, a existência de um contrato não desponta sempre de forma clara. Há situações imprecisas, nas quais a existência de um dever negocial é contestada. A incerteza, no entanto, não é obstáculo para a obrigação de indenizar. Isso significa, traduzindo o juridiquês, que havendo ou não o liame obrigacional pautado no Memorando de Entendimentos, poderá existir o compromisso de ressarcimento à parte prejudicada por conduta lesiva da outra parte, em especial quando existe uma violação da boa-fé objetiva.
Nesse espectro, verifica-se que um dos maiores riscos que decorrem da consagração de um MOU, é que ele seja considerado vinculante pelos Tribunais, quando a intenção das partes não era de se vincular definitivamente. Nos Estados Unidos, essa é uma das maiores preocupações dos acordantes que celebram um Memorandum of Understanding.
No caso paradigma “United Acquisition Corp. v. Banque Paribas”, o Tribunal americano adotou um teste de 4 fatores para definir se um MOU é ou não vinculante, a saber: (1º) se o documento contém declaração expressa e por escrito das partes; (2º) se uma das partes cumpriu com uma obrigação e a outra aceitou o cumprimento; (3°) se existem operações relevantes a serem pactuadas para que o procedimento tenha razão de existir; (4°) e se o acordo envolve questões complexas a serem definidas pelo instrumento escrito.
Ao contrário das Cortes Estadunidenses que discutem matérias alusivas às operações de MOU há muitos anos, os Tribunais Brasileiros ainda engatinham na
interpretação dos instrumentos e cláusulas contratuais. Na falta de entendimento consolidado sobre o tema em terras tupiniquins, o Tribunal de Justiça de São Paulo, por exemplo, já sinalizou tendência de atribuição de força vinculante ao instrumento.
Nesse caminho, o Desembargador do TJ/SP Marcelo Fortes Barbosa tratou do Memorando de Entendimentos como um contrato preparatório que vincula as partes com relação a “pontos de não retorno”, entendendo, portanto, que o documento teria instituído para os pactuantes um dever de celebração de um contrato principal.
Vê-se, desta maneira, que o caminho trilhado nos Tribunais Pátrios segue a linha de que o Memorando de Entendimentos, para fins legais, será equiparado à figura do contrato preliminar, pautando-se no ideal vinculante e possuindo subordinação ao que se encontra ali pautado.
Assim, partindo do pressuposto de que o MOU é um documento preliminar, entendemos que, uma vez firmado, acerca de determinados pontos ou elementos de um futuro contrato, a combinação somente poderá ser extinta justificada e motivadamente, especialmente se a causa da suspensão estiver ligada aos pontos nele harmonizados. A grande interrogação, porém, localiza-se na caracterização do que, de fato, pode ser entendido como justo motivo para a interrupção do convencionado no documento.
É perceptível que a especificação de justa causa para o rompimento do MOU é, visivelmente, um conceito jurídico carente de determinação, sendo, até este momento, examinado caso a caso pelos Tribunais deste País continental. Vale lembrar que a mera reconsideração de aspectos que já tinham sido definidos no Memorando de Entendimentos não preenche o requisito de justa razão para a sua descontinuidade.
Deste modo, a ruptura do acordado no âmbito de um Memorando de Entendimentos poderá ensejar responsabilidade civil pré-contratual, a qual somente será afastada se houver fundado motivo para a ruptura do acordado e, desde que não haja culpa da parte que deu causa ao rompimento do MOU, pautada no descumprimento dos deveres de boa-fé.
Conclui-se, tão logo, que o Memorando de Entendimentos é um instituto estrangeiro, que foi abraçado pelo Brasil, para descomplicar os acordos pré-contratuais entre partes que planejam o estabelecimento de um contrato futuramente. Ainda que embrionário na Terra dos Papagaios, torna-se cada vez
mais usual, dado que o propósito do regulamento é extremamente razoável, pelo que busca registrar os direitos e obrigações dos futuros sócios quanto ao negócio jurídico a ser pactuado, definindo as regras do campeonato antes de iniciado o jogo.
Para mais informações sobre o Memorando de Entendimento e demais espécies de contratos cíveis e empresariais, acesse o Blog do Colunista no site www.cavalcantereis.adv.br e deixe suas dúvidas nos comentários ou através do e-mail iuri@cavalcantereis.adv.br. Artigo escrito em coautoria com a advogada Thaynná de Oliveira Passos Correia, da equipe do Cavalcante Reis Advogados.
Link da do artigo no jornal: https://agazetadoamapa.com.br/coluna/1343/memorando-de-entendimentos
Autor: Dr. Iuri Cavalcante, CEO do Escritório Cavalcante Reis
Coautora: Dra. Thaynná Passos, Advogada Associada do Escritório Cavalcante Reis
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